A FORÇA DO ALTO



A experiência fundamental da Igreja no Pentecostes mostra-nos a importância da presença do Espírito Santo na vida dos cristãos como forma de ajudá-los assumir a mensagem de Cristo em sua vida diária e o impulso necessário para levá-la a todos os homens que dela necessitem. Na descida do Paráclito no Cenáculo em Jerusalém, no qual “estavam todos reunidos no mesmo lugar” e "perseveravam unanimemente na oração" (At 1, 14. 2,1), percebe-se o cumprimento da promessa feita por Jesus em Seu discurso na Última Ceia: ""Quando vier o Paráclito, o Espírito da Verdade, ele vos ensinará toda a verdade, porque não falará por si mesmo, mas dirá o que ouvir, e vos anunciará as coisas que virão. Ele me glorificará, porque receberá do que é meu, e vo-lo anunciará." (Jo 16, 13-14). Com a ascensão de Jesus de volta ao Pai, a Igreja nascente se viu aparentemente desguarnecida da força necessária para viver o Evangelho frente ao desafios do contexto sociopolítico e religioso em que vivia, bem como para a missão que lhe havia sido confiada por Cristo: "Ide, pois, e ensinai a todas as nações; batizai-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Ensinai-as a observar tudo o que vos prescrevi. Eis que estou convosco todos os dias, até o fim do mundo” (Mt 28, 19-20). O Paráclito – palavra que vem do grego Parákletos e significa defensor e consolador – vem ao encontro dos apóstolos e discípulos reunidos para lhes inspirar força diante das fraquezas e limitações de sua fé, além de lhes instilar coragem e ousadia na propagação da mensagem evangélica, já que é próprio do Espírito Santo iluminar a inteligência dos fieis acerca da verdade divina.
Também na vida pessoal de cada cristão a presença do Espírito se faz necessária pois, frente às dificuldades enfrentadas num tempo cada vez mais marcado pela fuga de Deus, pelo materialismo e pelo mundanismo, o discípulo de Jesus vacila na vivência da fé e esfria no compromisso apostólico. O próprio entendimento da relação íntima que cada um de nós é chamado a estreitar com Deus em caráter filial é-nos dado pela ação do Espírito em nós: “Sob a ação do Espírito Santo, o homem descobre até ao fundo que a sua natureza espiritual não é velada pela corporeidade mas, ao contrário, é o espírito que dá sentido verdadeiro ao próprio corpo. Com efeito, vivendo segundo o Espírito, ele manifesta plenamente o dom da sua adoção como filho de Deus” (Homilia de São João Paulo II no Domingo de Pentecostes, 31.05.1988). De fato, é o Espírito que nos ensina a chamar Deus de Pai: "A prova de que sois fi­lhos é que Deus enviou aos vossos corações o Espírito de seu Filho, que clama: “Aba, Pai!’’, já não és escravo, mas filho. E, se és filho, então também herdeiro por Deus" (Gl 6, 4). Uma vez inundados pelo Espírito Santo pelo batismo, somos inseridos em Cristo e tomamos parte da vida íntima da Trindade, por meio da qual somos constantemente incentivados a assumir sobre nós a paternidade divina de Deus e a nos tornarmos segundos Cristos no mundo – chamado último de todo batizado –, através de um caminho ascendente de conversão e transformação interior: “Para estar em contato com Cristo, é preciso primeiro ter sido tocado pelo Espírito Santo. É Ele que nos precede e suscita em nós a fé. Em virtude do nosso Batismo, primeiro sacramento da fé, a Vida, que tem a sua fonte no Pai e nos é oferecida no Filho, é-nos comunicada, íntima e pessoalmente, pelo Espírito Santo na Igreja” (Catecismo da Igreja Católica, § 683).
O Espírito Santo, que nos leva a experimentar a vida divina, atua em nós como força do Altíssimo, descendo sobre o ordinário das nossas vidas e cobrindo-nos com a Sua sombra, conforme anunciara o Arcanjo Gabriel a Nossa Senhora por ocasião da Encarnação do Verbo (cf. Lc 1, 35). À pergunta da Virgem ante o anúncio do anjo – “Como se fará isso?” – temos como resposta a ação concreta do Espírito em sua vida, tornando-a fecunda do próprio Deus feito homem e auxiliando-a com Sua graça santificadora: “Em Maria, o Espírito Santo manifesta o Filho do Pai feito Filho da Virgem. Ela é a sarça ardente da teofania definitiva: cheia do Espírito Santo, mostra o Verbo na humildade da sua carne; e é aos pobres e às primícias das nações que Ela O dá a conhecer” (CIC, § 724). Da mesma forma como, em Maria, o Espírito gera o Cristo que a redime, também em nós, cristãos, é pelo Espírito que o Filho de Deus é gerado e somos redimidos. Nas dificuldades da vida, diante das quais ecoa em nosso coração a mesma pergunta – Como se fará isso? –, por causa da nossa infidelidade e das nossas fraquezas, encontramos a resposta de Deus por meio da ação fortalecedora do Espírito: é d’Ele que nos vem o socorro para não incorrermos no pecado e no erro; é na Força do Altíssimo que nos apoiamos para não sermos soterrados pelas estruturas de morte e de iniquidade desde tempo atual. É pelo Poder do Alto que somos capazes de dar o nosso Fiat à vontade soberana do Pai e que Cristo nasce em nosso interior, fazendo de nós Seus servos, a exemplo do que aconteceu com Maria Santíssima (cf. Lc 1, 38).
Hoje, como na ocasião do Pentecostes original, somos reunidos por Deus para aguardar a descida do Espírito que nos ilumina e nos fortalece no chamado à missão. “Naquela manhã, (...) a chama do Espírito Santo desceu sobre os discípulos reunidos, pousou sobre cada um e acendeu neles o fogo divino, um fogo de amor, capaz de transformar. O receio desapareceu, o coração sentiu uma nova força, as línguas soltaram-se e começaram a falar com franqueza, de modo que todos pudessem compreender o anúncio de Jesus Cristo morto e ressuscitado. No Pentecostes, onde havia divisão e indiferença, surgiram unidade e compreensão” (Homilia do Papa Bento XVI no Domingo de Pentecostes, 27.05.12). A mesma coisa acontece entre nós na espera atual pela vinda do Paráclito, que nos possibilita crescer na vida comunitária e nos capacita a, de forma conjunta e solidária, superar as fraquezas surgidas na vida comum. O Espírito Santo ajuda a que, também como comunidade de fiéis, superemos nossas fraquezas com Sua força, de forma a nos constituirmos verdadeira unidade de amor.
Peçamos todos nós, pois, ao Espírito que “nos impulsione a 'caminhar juntos' como irmãos na construção de uma sociedade mais fraterna e na busca da plena unidade de todos os cristãos" e que nos “ajude a ser autênticas testemunhas do amor do Senhor por todos” (Audiência Geral do Papa Francisco, 05.06.19), a fim de podermos, auxiliados por Ele, caminhar “para as alturas de Deus, para que possamos viver já nesta terra a semente da vida divina que está em nós” (Homilia do Papa Bento XVI no Domingo de Pentecostes, 27.05.12). À imitação de Maria, possamos nós estar dispostos e disponíveis à ação do Espírito e permitir que Ele aja em nós como Força do Alto que supera a nossa incapacidade de amar e servir, a fim de que Cristo nasça no meio dos homens deste tempo.

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