RAÍZES E FRUTOS
Na
parábola do semeador, contada no capítulo 13 do Evangelho de São Mateus, Jesus
faz uma comparação entre o Reino de Deus e a semente jogada na terra por um
homem que “saiu a semear” (versículo
3). A Palavra de Deus, semeada pelo próprio Cristo no terreno da nossa alma, é
sempre fecunda em si mesma, sempre plena de realizações por sua própria força
salvífica, exatamente por ser “palavra de
vida eterna” (Jo 6, 68). Ele, o Semeador, a distribui de maneira abundante
em nosso meio, como manifestação plena de sua misericórdia por nós, e espera uma
resposta de amor da nossa parte que possibilite a esta semente germinar em nossas almas de modo a produzir frutos. O sentido último da semente, uma vez acolhida no solo, é ver manifestada a sua fecundidade, como caminho natural de
propagação de suas qualidades e para servir como alimento para os demais,
através dos frutos colhidos. A
semente que, pela pobreza do solo e pelas dificuldades do entorno em que foi
jogada, não gera frutos se vê privada da sua função precípua: germinar para florescer e frutificar.
Aqui a comparação de Jesus ganha sentido pedagógico total: a Palavra que Ele
dissemina – e que é Ele próprio, “pelo
qual tudo foi feito” (Jo 1, 3), doando-se totalmente aos demais – só cobra
valor se puder, no coração do homem – que é o terreno onde ela é plantada –, ganhar
vida e crescer, até chegar a ser pródiga
e nutriente para o próximo. Esta
Palavra, destinada a ser semente de vida em cada um de nós, é veículo das
promessas de Deus: ela "não volta
sem ter produzido seu efeito, sem ter executado minha vontade e cumprido sua
missão" (Is 55,11).
O
primeiro passo para que esta palavra cumpra sua missão em nós é o acolhimento dela em nossas vidas. Uma
semente que não é enterrada no solo não consegue germinar, pois o Maligno “arrebata o que foi semeado” (Mt 13, 19)
em nós e impede a obra de Deus de se estabelecer com firmeza. A semente resseca
diante da nossa indiferença, de nossa preguiça espiritual e de nossos pecados,
e o que tem de vital em si não nos alcança. O bom terreno é aquele no qual a
semente da Palavra consegue penetrar
profundamente, atingindo todas as áreas do nosso ser, e criar raízes. Deus quer de nós, antes de tudo,
uma atitude de abertura generosa de
coração; ele quer que nós nos abramos
a Sua ação criadora, a fim de, por ela, fincar alicerces sólidos e profundos em
nossas vidas. Devemos deixar que Deus aja em nós, que Ele produza raízes em
nós, que Ele seja fecundo em nossas almas. Isso não é sintoma de uma fé
passivista, mas apenas a constatação da primazia
de Deus em nossa história, pois estar aberto para Deus já é agir em Seu
favor, é confiar que só Ele realiza em nós a felicidade completa. Quanto mais
raízes Deus implantar nas áreas da nossa existência, maior e mais plena será
Sua posse daquilo que somos, temos e realizamos. E mais fecundo será o terreno do nosso coração, pois estaremos predispostos
ao Pai através da escuta – que nos
estimula a acolher cada vez mais a semente
plantada – e do diálogo – que aduba
mais e mais rápido e impede que nós nos tornemos solos inférteis, sem vida e sem alegrias.
Uma
vez fincado em nós por Suas raízes, Deus pode crescer e se tornar uma árvore
frondosa na terra do nosso coração. Isso só depende de que nós criemos e
mantenhamos constantemente as condições para que Ele possa realizar a Sua obra
nas nossas vidas. Isso significa regar
o solo com o louvor dos nossos lábios, alimentá-lo com o adubo da oração e da Eucaristia e permitir a poda dos galhos – as nossas imperfeições e pecados – que não
permitem o crescimento do que foi semeado em nós. A vida espiritual verdadeira
é um jogo virtuoso em que Deus toma a dianteira e nós deixemos que ele se
manifeste em e através de nós; cabe a nós atuar sempre no sentido de permitir que
venha a desenvolver-se o que foi começado. Como uma semente que, se bem
plantada, regada e cuidada, pode vir a tornar-se uma planta imensa e fecunda de
folhas e frutos. Uma árvore assim estabelecida é bênção para os demais por sua sombra – que protege das fadigas do
calor das preocupações e dos desafios – e por seus frutos – que alimentam os que estão famintos e abatidos. Nós,
cristãos, somos instrumentos do Pai para
o próximo, destinados a dar-lhe os
dons que recebemos d’Ele como fruto exclusivo de Sua imensa misericórdia. Uma
árvore que não cresce o suficiente e não dá os frutos no tempo devido tende a
secar e morrer; a obra de Deus que, em nós, não frutifica, que é estéril,
tende a nos afastar daquilo que Ele pensou para
nós desde toda a eternidade. Para Jesus, “o que foi semeado em boa terra é o que ouve e compreende a palavra”
(Mt 13, 23). Ouvir a Palavra significa
acolhê-la em nós e deixar que ela crie raízes profundas em nosso interior. Compreendê-la significa o entendimento e
o comprometimento necessários para que esta Palavra cumpra a sua missão
propícia através das nossas vidas, que é a de dar frutos. E dar frutos implica, necessariamente, como o próprio
Cristo provou na Árvore da Cruz, doarmo-nos
a nós mesmos como frutos agradáveis a Deus para saciar de amor e paz aos
homens do nosso tempo.
Somos estimulados, portanto, a deixar que Deus
finque raízes em nós como sinal de disponibilidade
e generosidade, assim como Maria,
o terreno mais propício e fértil que já existiu, estando totalmente aberta para
o Pai, permitiu, por seu sim, que a
Semente da Vida pudesse germinar em seu interior e gerar frutos de eternidade
para todos os homens. Possamos nós aprender da Mãe de Deus o segredo da
confiança na ação fecundante do
Senhor em nós, uma confiança filial
que se abre para o que o Pai deseja plantar e colher no terreno da nossa vida,
e a sermos, como ela foi e segue sendo na Igreja, férteis de Cristo para a humanidade.
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