O QUE É A VERDADE?
Uma
das passagens mais intrigantes dos Evangelhos é aquela na qual Jesus se apresenta
diante de Pilatos e este tenta lhe interrogar a respeito das acusações feitas
pelos chefes judeus e da Sua realeza. Após constatar da boca do próprio Jesus
de que ele era realmente rei perante o Seu povo e de que a verdade é o sinal
por meio da qual se chega a esta revelação, o procurador romano pergunta: “O que é a verdade?” (Jo 18,38). A
passagem parece dizer que Jesus calou-se diante da indagação e lança um olhar
mais apurado a respeito da missão Dele entre os seus e de como, ainda hoje,
esta dúvida ainda se encontra no coração dos homens e na ânsia do mundo em
tentar enxergar uma luz no fim do túnel. A verdade parece ser ainda um
privilégio e buscá-la é, acima de tudo, o motivo de o homem estar imerso na
frieza e na crueldade de si.
“Eu nasci e vim ao mundo para dar
testemunho da verdade. Todo aquele que está com a verdade, ouve a minha voz” (Jo
18, 37). Jesus parece responder a questão de Pilatos antes da formulação de sua
pergunta. De fato, a verdade é o próprio Jesus que, fazendo-se homem, dá à
humanidade a chance de retomar a dignidade que lhe é própria e estar bem perto
de seu Criador, como Ele mesmo nos diz: “Eu
sou o caminho, a verdade e a vida” (Jo 14,6). A verdade é o discurso de
Jesus em toda a Sua jornada pelo mundo, que Ele não cansa de proclamar e pela
qual deu a Sua vida. A verdade é, ainda, o fruto do Espírito Santo concedido
aos apóstolos no início da Igreja, como forma de exortá-los a abraçar os caminhos
da Nova Aliança. “Ele é o Espírito da
Verdade, que o mundo não pode acolher, porque não o vê, nem o conhece” (Jo
14, 17). O silêncio de Jesus ante a pergunta de Pilatos parece indicar a
eloqüência da mentira que ronda o mundo e que teima em calar as verdades
eternas que Deus coloca no mundo através de Seu Filho Divino. Jesus se cala
porque o mundo, mesmo ansioso pela Verdade, escolhe as “verdades” que lhe convêm,
da forma que mais lhe agrada. Só que o silêncio de Jesus é mais penetrante do
que as mil palavras de que o homem se utiliza para tentar se convencer das
mentiras que prega; seu silêncio anuncia o modo como Deus age no profundo do
coração da humanidade, tentando calar-lhe para em seguida realizar a sua obra
de amor.
O
Catecismo da Igreja Católica nos diz que “o
homem tende naturalmente para a verdade. É obrigado a honrá-la e testemunhá-la”
(CIC 2467). Deus, desde a criação do homem, infundiu em seu coração o
gérmen da verdade, a fim de se orientar diante de sua própria incoerência e
desorientação. Ao cristão cabe dar este testemunho da verdade de Cristo como
exigência própria da sua condição – “Ai
de mim se eu não evangelizar!”, é o que nos diz São Paulo na primeira Carta
aos Coríntios. São João arremata: “Porque
a vida se manifestou, e nós a temos visto; damos testemunho e vos anunciamos a
vida eterna, que estava no Pai e que se nos manifestou” (I Jo 1, 2). O
próprio Jesus não se calou ante a cegueira do mundo, dando a vida para tornar
realidade o que pregou, a fim de transformar o coração dos homens e de atestar
a sabedoria de Deus. Agindo no escondimento da fé, os cristãos de hoje também
não devem se calar, assumindo para si a tarefa de levar a verdade a quem que
seja, alicerçada, evidentemente, na coerência de vida e de atitudes: “A verdade ou veracidade é a virtude que
consiste em mostrar-se verdadeiro no agir e no falar, guardando-se da duplicidade,
da simulação e da hipocrisia” (CIC 2469).
No
coração do indivíduo, deve arder ainda mais a verdade de Cristo para que ele não se
deixe entregar às más inclinações de seu coração e às cadeias de pecado que o
mundo lhe oferta de maneira insistente e incisiva. O Catecismo nos diz que “o discípulo de Cristo aceita ‘viver na
verdade’, isto é, na simplicidade de uma vida conforme o exemplo do Senhor,
permanecendo em sua
Verdade ” (CIC 2470).
Mesmo
que o mundo grite mais alto e se recuse a escutar a palavra de Deus, ainda
temos o silêncio que, ofertado para Deus, produz muito fruto no coração
daqueles que desconhecem a Graça. Seja de que maneira for, o mundo de hoje
precisa saber que há uma Verdade, e que ela é Vida e Caminho de amor para
aqueles que a acolhem em seu coração. Uma Verdade que, mesmo escondida no
exemplo de tantos e tantos cristãos, é certeira em revelar a grandeza do amor
de Deus em nós.
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